Hoje, ao caminhar para o ponto de ônibus,
cinco e vinte e cinco, o dia ainda se escondia sob o negro véu da noite.
Meu corpo levava o peso da mochila.
Meus olhos, o ardor do sono.
Minha mente, a leveza dos sonhos.
As luzes amarelas das ruas tentavam ofuscar o brilho das estrelas.
Chegando à parada, abrigo tão desamparado,
brevemente, envolvi-me no esquálido ambiente.
Gente.
Povo.
Abandono.

Abandonou-me o chão.
Largado, fui buscar a Lua, lua nova,
velho brilho,
forte brilho,
intensa lua.

Os meus ouvidos perceberam o ronco do motor,
chegara o ônibus.

Depois de entraves, arranques e encontrões,
ainda pude vê-la, da minha confortável e ereta posição,                  através dos arranhados vidros, despedindo-se de mim.

Sinal. Hora de apear e atravessar o parque da cidade.
Mendigos.
Andarilhos.
Fétido odor. Entrada triunfal.
Drogados.
Moço, o que tem na minha mochila são provas, avaliações, papéis...
Não são dólares!
Ainda bem. Ouviram meus pensamentos.

A alfombra de orvalho, sobre o gramado,
resolveu buscar o céu em forma de neblina.
Começam a passar as magricelas,
os atletas, os saudáveis corpos, os trabalhadores... aqui, acolá, alhures.
Bom dia!
Os idosos apertam os passos.

Sinal. Hora de apear e atravessar o parque da cidade.
O ouro do Sol se espalha pela paisagem ainda fria.
Os olhos já não ardem mais.

A beleza invade o dia, frestas, buracos, ninhos e árvores.
A minha escola se ergue aos poucos,
branca e azul,
na paz e no bem.

A beleza invade o dia, frestas, buracos, ninhos e árvores.
A escola se ergue aos poucos,
branca e azul,
fria e concreta.

Os primeiros sorrisos aparecem.
Aparecem os primeiros afagos, cumprimentos.
Sentimentos, de quem fica, de quem vai e de quem se foi,
pairam no ar e param nos corações.

Os sorrisos aparecem.
Da Angélica, do João, da Nírian, do Cláudio, da Heloísa, do Antônio,
da Luzinete, do José, da Luísa, do Dudu, da Maria...
Exemplos permanecem.
A história está escrita.
O sinal toca...
Pai nosso... a aula é iniciada.


A vida prossegue...
ávida,
prossegue a vida...